Jano, escreveu:
Até
sempre, Filipe !
Sim,
até sempre !
Há
momentos, há episódios destas nossas vidas, que nos marcam para
sempre. Os momentos em que a morte já precedeu a definitiva ausência
são dos maiores e dos piores entre os piores. É a nossa forma de
sentir, é a nossa cultura, somos nós a enfrentarmo-nos nos nossos
labirintos, empurrados pela mão da poderosa e infalível “ceifeira”.
E, assim, a morte mais nos dói em vida !
Filipe,
meu “primo em terceiro grau” – meu Amigo em primeiríssimo grau
!
Invoco
os laços familiares também porque tu os prezavas. E é muito bom
sinal nós prezarmos os familiares. E, para além disso, nós
aprendemos, facilmente aliás, a curtir a mútua companhia à medida
que as circunstâncias da vida nos foram juntando.
Sim,
já antes nos conhecíamos, obviamente. Eu já tinha ouvido falar
muito de ti. Tu és mais velho uns anitos. Eu soube de tuas grandes
aventuras em tua juventude. Então, era um quase mistério de que se
falava baixinho. Teu filho varão – que ainda mais cedo partiu –
é o maior testemunho dessa tua vida. Tenho em minha memória, tão
nítida como uma fotografia, a foto de tua companheira segurando ao
colo vosso filhinho, à tua espera, quando tu saltavas para fora dos
cárceres dos fascistas – lembras-te ? - um ou dois dias após o
25 de Abril de 1974.
E
como foi gira e invulgar aquela tua festa – vários 25 de Abris
após – festa partilhada com tua companheira maior no dia de vosso
casamento – pela Igreja! Tu e ela, ambos de branco vestidos, na
carroça puxada por uma burrinha que, não sendo de Belém (na velha
Israel), o era de Vila Franca da Beira. Sim, quem vos viu não (vos)
esquece.
Em
boa hora o fizeram que outros e ainda mais sublimes acontecimentos
projectaram e se consumaram na vossa mais do que ímpar descendência
– três belíssimas jovens que, hoje, te choram porque partiste e
tua ausência lhes queima por dentro.
Hoje
e sempre, para as quatro mulheres de tua vida, Filipe, aquele abraço
que sendo dolorido também é de um amigo que hoje sofre mas que não
chora.
E
não chora porque tu próprio me disseste para assim fazer quando
soasse esta hora que tu sabias que ia chegar mais cedo que tarde.
Perante a inexorável perspectiva, a tua serena coragem, divertida
até que ela chegava a parecer, mais essa tua forma de ser e de
transparecer são, para mim, a última e mais impressiva referência
que de ti, vivamente, vou guardar.
Ah!
Vou também propor a tua condecoração, a título póstumo, como
fundador emérito da “Real-República, Livre, Soberana e
Independente de Vila Franca da Beira” – tás a ver ? – dentro
do espírito daquele imorredoiro projecto que nós – sob teu
comando, Meu Coronel, que também é “conFrade” – que nós
íamos implantar, com nossos Correligionários e Amigos, para glória
maior desta nossa Vila Franca da Beira e suas ínclitas Gentes !
Ah
! Bolas! Isto custa !
Olha,
não choro por fora mas deixa-me chorar por dentro, um pouquito que
seja… Sabes, preciso disso, nesta hora.
Meu
grande Amigo.
Até
sempre, Filipe !
João
Dinis, Jano
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